Decisões

TJSP reafirma culpa exclusiva da vítima em acidente de trânsito.

Em abril de 2022, o Juízo da 1ª Vara Cível do Foro Regional V – São Miguel Paulista da Comarca de São Paulo/SP reconheceu a culpa exclusiva da vítima em acidente de trânsito, como decorrência da ausência de cautela mínima desta vítima (pedestre) quando da transposição de via pública em local inapropriado.

Em termos de responsabilidade civil, parcela significativa da doutrina pátria considera que, na Lei 10.406/2002 (Código Civil), o legislador adotou, como regra, a responsabilidade subjetiva (leitura que deriva do disposto nos artigos 186, 187 e 927 do Código Civil). É dizer: o dever de indenizar (em outros termos, de reparar o dano causado) depende, em regra (e além da existência de conduta, dano e nexo de causalidade), da culpa do autor do dano (quem praticou a conduta), à exceção dos casos em que se admite a responsabilização objetiva (em que o dever de indenizar independe do elemento culpa do agente). Como exemplo de responsabilidade objetiva no próprio Código Civil, por outro lado, é possível destacar o Parágrafo único do artigo 927 e os artigos 932 e 933, lidos conjuntamente (que, em seu inciso III, estabelece que o empregador é responsável pela reparação civil, “por seus empregados, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele”).

Mas o Código Civil não é a única fonte legislativa que prevê a responsabilização civil. O Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990), por exemplo, estabelece, como regra, a responsabilização objetiva, já que o “fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores” (artigo 12), em hipótese inversa à regra geral do Código Civil.

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Entretanto, mesmo nas hipóteses de responsabilidade objetiva, é possível afastar a responsabilização daquele a quem se imputa a conduta causadora do dano, se há configuração da culpa exclusiva da vítima. E é exemplo dessa possibilidade o disposto no inciso III do Parágrafo 3º do artigo 12 Código de Defesa do Consumidor.

Ainda com relação à responsabilidade civil, esta pode ser solidária, “quando na mesma obrigação concorre mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado, à dívida toda” (artigo 265 do Código Civil), o que depende de expressa previsão legal ou contratual (ao que se soma ao disposto nos artigos 7º, Parágrafo único e 18 do Código de Defesa do Consumidor).

No caso concreto, em janeiro de 2018, dois homens tentaram atravessar o Viaduto Paulo Ayres, em local no qual o trânsito de pedestres é proibido, e, ao superarem o obstáculo de separação de via, foram atingidos por um caminhão, que transitava em velocidade compatível com o limite da via. E, em razão dos danos que um dos homens alegou ter sofrido, este propôs ação de indenização contra o motorista, contra a empresa proprietária do veículo e contra a empresa que tinha sua logomarca estampada no compartimento de transporte da carga.

Oferecida a contestação pelos réus (em que denunciaram a lide a terceiros [seguradora e responsáveis pela contratação do serviço de transporte]), foi realizada a audiência de instrução, oportunidade em que ouvidas as vítimas (autor da ação e seu colega) e testemunhas (terceiros, arrolados pelo autor e pelos réus).

Encerrada a audiência e apresentadas as alegações finais pelas partes, em razão dos elementos de prova que constavam nos autos (e dos depoimentos colhidos em audiência), o Juízo da 1ª Vara Cível do Foro Regional V – São Miguel Paulista da Comarca de São Paulo/SP julgou os pedidos iniciais improcedentes porque “restou evidenciada a culpa da própria vítima, por ter realizado travessia em local inapropriado”, inclusive porque “não se pode prever ou esperar que uma pessoa realize travessia no local dos fatos” e porque houve o “rompimento de barreiras pelo autor”, circunstância em que competia, à vítima, “agir com cautela redobrada”, o que não ocorreu (em especial, porque existia, nas proximidades do local, faixa de segurança, mas o autor “preferiu transpor a via pública em local não apropriado, fazendo-o de inopino e descuidadamente, emergindo dessa conduta a sua culpa”).

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A sentença foi publicada em abril de 2022.

Para saber mais, confira a íntegra da decisão.

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