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TJRS acolhe alegação de erro de fato e reconhece inexistência material de número de ações alegadas como adquiridas por pessoa física

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul acolheu erro de fato informado pelo banco em agravo de instrumento, reconhecendo a inexistência material do número de ações preferenciais que o autor alegava serem de sua propriedade e negando-lhe, por consequência, o recebimento de milhões de reais.

No caso em comento, foi ajuizada ação de prestação de contas por pessoa física em face de instituição financeira na qual o autor alegava ter adquirido quotas de ações do banco em 1985 e que, após a compra, nunca mais obteve qualquer informação sobre o investimento, razão pela qual pretendia receber contas acerca de suas ações.

Citado, o banco apresentou contestação postulando a improcedência dos pedidos, visto que nunca se negara a prestar as informações pretendidas.

Realizada a audiência conciliatória, o banco se comprometeu a prestar as informações acerca das ações do autor. Diante da inércia do banco, solicitou a parte autora o prosseguimento da ação com a intimação do banco para exibir os documentos, sob pena de serem tidas como verdadeiras as suas alegações de que seria detentor de 3.407.559 ações preferenciais na condição de sócio fundador do Banco, declarando ser credor de montante líquido, decorrente da privatização da instituição em 1997.

Ainda em razão da inércia do banco, foi proferida sentença que converteu a ação de prestação de contas em ação de cobrança e reconheceu o direito do autor aos valores por ele apontados como devidos em correspondência às 3.407.559 ações que teria adquirido. 

Iniciado o cumprimento de sentença, o banco apresentou impugnação alegando erro de fato, que foi desacolhida, fato este que ensejou a interposição de recurso de agravo de instrumento ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

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O Tribunal por sua vez, converteu o julgamento do recurso em diligência para realização de perícia econômica financeira, por economista especialista na matéria, sob o fundamento de que “o erro de fato corresponde considerar existente o que não existe, ou considerar inexistente o existente. É o que está, ou não, ocorrendo diante da tamanha discrepância de valores – o [valor] em execução é de R$ 6.505.386,98, o valor alegado como devido pelo banco é de aproximadamente R$ 750,00 –, tremenda discrepância que justifica converter o julgamento em diligência para que se reconstitua a situação histórica em discussão a partir do valor em agosto de 1986.”

Realizada a perícia, constatou o perito “a existência material de 65 (sessenta e cinco) ações preferenciais do capital social, ou a inexistência material do número de 3.407.559 ações preferencias convertidas em indenização em dinheiro”.

Diante disso, retomado o julgamento do recurso do banco, entendeu o Tribunal por dar provimento ao agravo e extinguir o cumprimento de sentença pela inexistência material e jurídica do número de ações preferenciais nominativas do capital social que serviu de referência à conversão e ao cumprimento da sentença. 

Asseverou o Relator em seu voto que, embora “não seja fácil frustrar a expectativa milionária resultante de prestação de contas que levou diversos anos, não pode a sentença ou acórdão deferir o que não existe material e juridicamente”, ainda que o banco tenha sido negligente no procedimento anterior e, nesses termos, afirmou ser equivocada a decisão que desacolheu a impugnação do banco, em razão dos seguintes pontos:

  • é de incumbência do titular das ações do capital de sociedade anônima negociá-las na bolsa quando do seu interesse, inexistindo obrigação das companhias em indenizá-las conforme reconhecido pela decisão recorrida;
  • é impossível que a sentença defira o que inexiste material e juridicamente – o que ocorreu no caso concreto quando o magistrado converteu a prestação de contas em indenização a ser paga em dinheiro, deferindo devolução sobre base que não existia na proporção ou valor concedidos pela decisão, já que comprovado pericialmente que inexistiam o total de 3.407.559 ações preferencias alegadas pelo autor como de sua propriedade em 1997, e convertidas na sentença em indenização.
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Afirmou o Relator que o laudo pericial demonstrou que, à época da sentença, o autor possuía 65 (sessenta e cinco) ações preferencias nominativas, no valor de R$ 428,40 ou 0,12 centavos por unidade na data e que isso se justifica e é compatível com a realidade das sociedades anônimas, já que novos aportes de capital diminuem a proporção que as ações adquiridas representam, tornando a participação acionária reduzida.

Concluiu, assim, pelo “provimento do recurso e consequente extinção do cumprimento de sentença pela inexistência material e jurídica do número de ações preferencias nominativas do capital social que serve de referência à conversão e ao cumprimento de sentença”.

O acórdão foi publicado em julho de 2019.

Para saber mais, confira a íntegra da decisão.

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