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TJPE defere o ingresso da FEBRABAN na qualidade de “amicus curiae” em IRDR que discute empréstimos bancários entabulados com pessoa analfabeta
Em sede de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) instaurado perante o Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, deferiu-se o ingresso da FEBRABAN (Federação Brasileira de Bancos) na qualidade de amigo da corte (“amicus curiae”), observados os pressupostos da especialização e a adequada representatividade no que tange à matéria de direito discutida no Incidente.
O referido Incidente (IRDR) originou-se de Ação Declaratória de Inexistência de Débito Cumulado com Pedido de Indenização por Danos Morais e Repetição de Indébito ajuizada sob a alegação de que o benefício previdenciário da autora era objeto de desconto de parcelas de empréstimo bancário que nunca teria contratado, o fato que estaria justificado por tratar-se de pessoa analfabeta. Desta forma, a autora pleiteou a declaração de inexistência de débito e a condenação do Banco réu ao pagamento de danos morais, bem como à repetição em dobro das parcelas cobradas.
Uma vez observada a multiplicidade de demandas que versavam sobre a formalização de contratos de empréstimo bancário com analfabetos (art. 976, CPC), foi admitida, pela Seção Cível do TJPE, a instauração do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas.
No julgamento da afetação do processo, a E. Seção entendeu por ampliar o objeto da causa e afetar, para fins de julgamento repetitivo, os temas descritos abaixo, assim como determinou a suspensão de todos os processos pendentes naquele Estado, em ambos os graus de jurisdição e no âmbito dos juizados especiais, nos quais se discute a questão nuclear controvertida:
Questão nuclear: condicionamento da validade do negócio jurídico de empréstimo bancário a pessoa analfabeta à observância de formalidade essencial para sua contratação;
Questão adjacente: configuração da responsabilidade objetiva de instituição financeira pelo dever de indenizar pessoa analfabeta por dano moral in re ipsa, na hipótese de concessão de crédito sem a observância de formalidade essencial para a contratação;
Questão adjacente: possibilidade de aplicação ex officio do instituto da compensação, previsto no art. 368 do CCB, quando for provada a utilização, por pessoa analfabeta, de quantia disponibilizada por instituição financeira em decorrência de mútuo feneratício efetivamente não contratado pelo tomador, ou, ainda, judicialmente declarado inválido por ter sido contratado sem a observância de formalidade essencial;
Questão adjacente: quando a causa de pedir da pretensão de declaração de inexistência de débito, reputado decorrente de empréstimo bancário a pessoa analfabeta, estiver limitada à negativa de contratação do negócio jurídico, é possível o
reconhecimento da nulidade por vício formal do contrato refletido em documentos juntados aos autos.
Com isso, objetivando o amplo debate, a FEBRABAN manifestou-se nos autos requerendo sua admissão como terceiro interveniente na figura de “amicus curiae”. Para tanto, demonstrou sua legitimidade, na forma exigida pelo caput do art. 138 do CPC, a fim de figurar como “auxiliar do juízo” tendo em vista a relevância social da tese a ser firmada e sua eminente especialização na temática discutida.
Neste diapasão, a FEBRABAN, associação sem fins lucrativos que congrega instituições financeiras bancárias e associações representativas dessas instituições, expôs o fato de que a controvérsia discutida no IRDR se mostra sensível a todas as instituições que operam no âmbito do Sistema Financeiro Nacional, além de que, as “questões adjacentes” tratadas, influenciam diretamente na prática e defesa jurídicas das instituições financias do Estado.
Também, argumentou que, diante da relevância da matéria, a tese firmada repercutirá de maneira direta nos associados da FEBRABAN, razão pela qual disporia de representatividade e especialização adequadas para figurar como “amicus curiae”.
Além disso, a FEBRABAN poderia sugerir soluções para os temas afetados, buscando evitar generalização da excepcionalidade, visto que o acórdão de afetação ampliou o objeto da causa, tendo sido apresentadas as seguintes soluções para a questão nuclear e para as respectivas questões adjacentes:
Questão nuclear: não há exigência de forma específica para contratação de empréstimo bancário por pessoa analfabeta, devendo a nulidade ou a anulabilidade dos contratos serem analisadas a partir dos vícios previstos na legislação vigente, notadamente os arts. 166 e 171 do Código Civil, e art. 51 do Código de Defesa do Consumidor, considerando sempre a particularidade de cada caso concreto, observado o previsto no art. 595 do Código Civil;
Questões adjacentes: : (i) não há dano moral “in re ipsa” na hipótese de concessão de crédito à pessoa analfabeta sem a observância de formalidade essencial para a contratação; (ii) a restituição das partes ao status quo anterior é decorrência lógica da declaração judicial de inexistência ou nulidade do negócio jurídico; (iii) “quando a causa de pedir da pretensão de declaração de inexistência de débito, reputado decorrente de empréstimo bancário a pessoa analfabeta, está limitada à negativa de contratação do negócio jurídico”, não “é possível o reconhecimento da nulidade por vício formal do contrato refletido em documentos juntados aos autos”.
Em seguida, a Seção Cível do TJPE proferiu decisão admitindo a intervenção da FEBRABAN na qualidade de “amicus curiae”, entendendo que a entidade requerente preencheu os requisitos exigidos pelo artigo 138, CPC, sendo eles a especialização e representatividade adequada, dando, então, poderes ao interveniente para manifestar-se nos autos sobre questões nucleares e adjacentes com vista à fixação da tese, podendo, inclusive, realizar sustentação oral de seus argumentos solucionadores.
Consequentemente, no decorrer da discussão ainda existente no Incidente, a FEBRABAN contribuirá, como amigo da corte, na qualidade de auxiliar do juízo oferecendo soluções para as questões debatidas, influindo diretamente na fixação da tese, podendo, inclusive, recorrer da decisão que, futuramente, julgar o IRDR (art. 138, §3º, CPC), tudo isso dado que a tese a ser fixada impactará no Sistema Financeiro Nacional em razão da demonstrada relevância da matéria.