Moeda e crédito

Justiça reconhece a legalidade da cobrança de tarifa de compensação de cheques de baixo valor, antes da edição da Resolução nº 3.518/2007 pelo Banco Central

Em ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região entendeu que antes da edição da Resolução nº 3.518/2007, do Conselho Monetário Nacional, não havia norma que vedasse a cobrança de tarifa incidente sobre a emissão de cheque de pequeno valor. 

Na ação, o Ministério Público Federal pretendia a condenação de instituição financeira a efetuar o ressarcimento do valor cobrado a título de taxa pela compensação de cheques de pequeno valor, bem como indenização equivalente ao dobro do valor arrecadado a tal título, ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos – FDD. O fundamento utilizado foi o de que, apesar de ser possível o repasse ao consumidor do preço da compensação bancária, tal tarifa independe do valor do cheque a ser compensado, não havendo, no seu entender, qualquer justificativa para que a referida tarifa fosse maior quando a compensação efetuada se referisse a cheque de baixo valor. 

 Em contestação, a instituição financeira observou que a tarifa de cheques de baixo valor deixou de existir em razão da edição da Resolução nº 3.518/2007, do Banco Central, que proibiu a sua cobrança. Antes disso, não existia proibição da cobrança da tarifa, de modo que a atuação no sentido de estimular ou desestimular determinada conduta pelo consumidor não era vedada.

O Juízo da 2ª Vara Federal de São Paulo proferiu sentença para julgar improcedentes os pedidos iniciais ao fundamento de que não se verificava que a cobrança de taxa a maior pela compensação de cheque de baixo valor configurasse prática abusiva, manifestamente excessiva ou que colocasse o consumidor em desvantagem exagerada. Desta forma, não restou demonstrada a alegada abusividade, haja vista que esta somente poderia ser caracterizada quando comparada à taxa exigida pela compensação de outros cheques. 

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O Ministério Público Federal interpôs recurso de apelação, ao qual foi negado provimento pela Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Além de reafirmar os fundamentos da sentença, a turma julgadora ressaltou que o Banco Central, na disciplina e fiscalização do sistema financeiro, não proibia a cobrança de tal tarifa até a edição da Resolução nº 3.518/2007. 

Os julgadores, além disso, consignaram que a cobrança de tarifas parte do parâmetro de custos de estruturas operacionais e de preços envolvidos com o processamento das ordens de pagamento. A partir desses parâmetros é que se fixa, com maior ou menor precisão, critério para que o uso de cheques por clientes não gere custo adicional não coberto por tarifas já pagas. Dentro de determinado valor, o sistema absorve o custo e, fora dele, exige-se pagamento de tarifa adicional. 

Quando, além do valor baixo para cada ordem de pagamento, ainda exista uso intensivo de cheques, a cobrança é feita por emissão de talonário. Portanto, excluir da cobrança da tarifa os cheques acima de certo valor não viola, observado o critério de custos e preços, o princípio da isonomia, pois atende ao exame de circunstâncias objetivas e razoáveis. 

Por fim, asseverou a Turma Julgadora que não se revela abusiva a cobrança, ainda que exista o propósito de estimular o uso de outros meios de pagamentos quando envolvidos valores mais baixos. Existindo serviço prestado e custo envolvido, e sendo o preço fixado com observância de margem técnica, não se pode concluir por cobrança abusiva ou fundada em critério lesivo à isonomia. Isso porque a prática de abuso ou ilegalidade não pode ser presumida, exigindo a produção de prova técnica, profunda e específica, para o reconhecimento da procedência do alegado na inicial. 

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Em face do acórdão do recurso de apelação, o Ministério Público interpôs recurso especial, que foi remetido ao STJ e autuado sob o nº 1465923/SP.

O Ministro Marco Buzzi deu provimento ao recurso especial para reconhecer a abusividade da cobrança da tarifa para compensação de cheque emitido em valor baixo. Em suas palavras, o STJ já se manifestou no sentido de reconhecer a abusividade da aludida tarifa em diversos precedentes, razão pela qual a sentença exarada em primeira instância e o acórdão proferido no Tribunal Federal destoam do entendimento firmado pela Corte Superior, devendo, portanto, serem reformados. 

A instituição financeira interpôs agravo interno sob os fundamentos de que a matéria não poderia ser objeto de julgamento por decisão monocrática, já que não havia jurisprudência consolidada no Tribunal, além do fato de a reforma do acórdão demandaria o reexame de aspectos fáticos do processo. Por fim sustentou-se a legalidade da cobrança da referida tarifa.

O Ministro Marco Buzzi conheceu do agravo interno e deu-lhe provimento para reconsiderar a deliberação monocrática anterior, tornando-a sem efeito. Em acolhimento ao argumento da casa bancária, o Ministro conheceu do recurso especial para negar-lhe provimento, em virtude de que rever a conclusão do acórdão recorrido quanto à abusividade na cobrança das tarifas bancárias demandaria o revolvimento do contrato e do contexto fático-probatório dos autos, procedimento vedado em recurso especial, em razão da incidência das Súmulas 5 e 7, do STJ.

O trânsito em julgado da decisão monocrática deu-se em 11/03/2021 e, na mesma data, os autos foram remetidos ao Supremo Tribunal Federal, para julgamento do agravo em recurso extraordinário, interposto pelo Ministério Público Federal, no âmbito do TRF-3, após a inadmissão de seu recurso extraordinário.

Para saber mais, confira a íntegra da decisão.

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