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Juiz declara a inconstitucionalidade de Lei Municipal que determinava suspensão das cobranças dos empréstimos consignados dos servidores
O Juiz da Vara da Fazenda Pública, Empresarial e de Registros Públicos da Comarca de Ribeirão das Neves declarou a inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 4.103/2020, que determina a suspensão, por 90 dias, das cobranças dos empréstimos consignados contraídos pelos servidores públicos municipais.
A ação foi ajuizada por instituição financeira que possuía convênio ativo com o Município para a concessão de crédito consignado aos seus servidores ativos, aposentados ou pensionistas. O pedido principal de mérito foi no sentido de que a ação fosse julgada procedente para, reconhecendo-se incidentalmente a inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 4.103 /2020 e afastando-se a sua eficácia em relação à instituição autora, condenar o Município réu ao cumprimento da obrigação de fazer consistente em efetivar regularmente todos os descontos em folha previstos para o pagamento das parcelas dos empréstimos consignados contraídos por seus servidores ativos, inativos e pensionistas, repassando esses valores ao autor, nos termos do que dispõem os Convênios e a legislação federal.
Em relação ao pedido de declaração de inconstitucionalidade da Lei, a instituição financeira autora deduziu três fundamentos, quais sejam: (i) a usurpação da competência da União para legislar (de forma privativa) sobre direito civil e sobre política de crédito (art. 22, incisos I e VII); (ii) a violação ao princípio da separação de Poderes e à iniciativa legislativa exclusiva do Poder Executivo para dispor sobre a organização da Administração Pública (arts. 2º, art. 61, § 1º, II, “c”, e art. 84, VI, “a”); e (c) ofensa aos princípios constitucionais da segurança jurídica e da incolumidade do ato jurídico perfeito frente aos efeitos da lei nova (art. 5º, inciso XXXVI, da CF), bem como da proporcionalidade (art. 5º, inciso LIV, da CF) e à livre iniciativa (art. 1º, inciso IV, e 170, caput).
O Município de Ribeirão das Neves apresentou a contestação, na qual sustentou, em síntese, que: (i) a Lei Municipal nº 4.103/2020 deve ser entendida como uma norma que regulamenta direito do consumidor e de cunho econômico, temas ligados à competência concorrente entre os Entes da Federação, conforme art. 24, incisos I e V, da CF, de modo que a competência conferida aos Estados para complementarem as normas gerais da União não exclui a competência do Município para fazê-lo; e (ii) não há violação ao ato jurídico perfeito, ao princípio da proporcionalidade e à livre iniciativa, tendo em vista que a pandemia configura caso fortuito a justificar as medidas previstas na Lei, a regulamentação de setores econômicos em matéria de consumidor é uma possibilidade aberta pela própria Constituição, e os contratos atingidos pela norma são classificados como contratos de trato sucessivo, que se prolongam no tempo, sendo possível que novas normas incidam sobre eles e passem a regular as situações futuras.
Em sede de réplica, a instituição autora rebateu os argumentos de defesa e destacou que o Plenário do STF, no julgamento da ADI 6484, fixou a tese no sentido de que “é inconstitucional lei estadual que determina a suspensão temporária da cobrança
das consignações voluntárias contratadas por servidores públicos estaduais”, sob o fundamento de que a referida Lei adentrou na competência privativa da União, prevista no art. 22, I e VII, da Constituição Federal, para legislar sobre direito civil e política de crédito.
Nesse cenário, o Juiz da Vara da Fazenda Pública, Empresarial e de Registros Públicos da Comarca de Ribeirão das Neves julgou procedente a ação, para declarar a inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 4.103/2020, sob o fundamento de que houve a usurpação da competência da União para legislar (de forma privativa) sobre direito civil e sobre política de crédito (art. 22, incisos I e VII, da Constituição Federal).
O juiz destacou que esse entendimento está alinhado com o que o Supremo Tribunal Federal decidiu no julgamento das ADI’s 6484, 6475 e 6495, nas quais o STF também declarou a inconstitucionalidade de Leis Estaduais que previam a suspensão do desconto dos empréstimos consignados nas folhas de pagamento dos servidores dos Estados do Rio Grande do Sul, Maranhão e Rio de Janeiro, respectivamente.