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Erro material verificado na coisa julgada pode ser corrigido a qualquer tempo

A Décima Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo decidiu que o erro material verificado na coisa julgada pode ser corrigido a qualquer tempo, inclusive na fase de execução do julgado.

O acórdão foi exarado em ação judicial, na qual o poupador pleiteava a alteração dos índices que remuneraram os saldos de diversas contas de poupança de sua titularidade, mantidas em instituição financeira, no período em que editados os planos econômicos denominados Bresser, Verão, Collor I e Collor II.

Segundo alegou o autor da ação, as normas, que instituíram os planos econômicos, com previsão de índices diversos para remuneração das contas de poupança, não poderiam retroagir seus efeitos para fatos pretéritos, pois o poupador já teria adquirido o direito a determinado índice, previsto na norma que anteriormente regulava a matéria.

Dessa forma, requereu a procedência da ação, para condenar a instituição financeira ao pagamento das diferenças de índices, correspondentes aos seguintes percentuais, acrescidos de juros remuneratórios:

  • 26,06% em julho de 1987, a ser aplicado sobre o saldo existente na conta na data do aniversário anterior, qual seja, junho de 1987;
  • 42,72% em fevereiro de 1989, a ser aplicado sobre o saldo existente na conta na data do aniversário anterior, qual seja, janeiro de 1989;
  • 84,32% em abril de 1990, a ser aplicado sobre o saldo existente na conta na data do aniversário anterior, qual seja, março de 1990;
  • 44,80% em maio de 1990, a ser aplicado sobre o saldo existente na conta na data do aniversário anterior, qual seja, abril de 1990; e
  • 26,87% em fevereiro de 1991, a ser aplicado sobre o saldo existente na conta na data do aniversário anterior, qual seja, janeiro de 1991.

 

Em sua defesa, a instituição financeira ré arguiu a impossibilidade de o autor reclamar por rendimentos 1987, 1989, 1990 e 1991, porque sobre eles incide a prescrição de acordo com a disposição do art. 178, §10, inc. III, do Código Civil.

Também defendeu inexistir direito adquirido a determinado regime monetário ou padrão de moeda e que não cabia conduta diversa à instituição financeira que não a de cumprir com as expressas disposições legais, que determinavam a alteração do índice de rendimento das contas de poupança a partir das datas de suas edições.

Esclareceu que a instituição financeira pagou aos seus clientes, inclusive ao autor, o índice do IPC (de 84,32%) incidente sobre os saldos verificados nas contas de poupança em março de 1990.

Asseverou, por fim, e que o autor não faz jus a qualquer remuneração incidente sobre os saldos das contas de poupança iniciadas ou renovadas após 15 de junho de 1987 e 15 de janeiro de 1989 (que aniversariavam na segunda quinzena), incidindo sobre estes a sistemática da lei nova e que não há que se falar em direito adquirido à remuneração sobre os valores bloqueados pelo Banco Central do Brasil em abril de 1990, que excederam ao saldo não bloqueado de NCZ$ 50.000,00 (cinquenta mil cruzados novos).

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Em sentença, o juízo de primeiro grau afastou a alegação de prescrição dos juros contratuais, e, no mérito, julgou procedente a ação, condenando a instituição financeira ré ao pagamento das diferenças entre a remuneração havida nas contas de poupança do autor e os índices de 26,06%, para junho de 1987, 42,72%, para janeiro de 1989; 84,32%, para março de 1990; 44,80%, para abril de 1990; e 21,87% para fevereiro de 1991, corrigidas monetariamente pela Tabela Prática do Tribunal de Justiça, com acréscimo de juros contratuais de 0,5% ao mês, desde o inadimplemento de cada uma das obrigações e de juros moratórios de 1% ao mês, contados da citação.

Todavia, a sentença observou que apenas as cadernetas de poupança iniciadas ou renovadas até 15 de junho de 1987 e 15 de janeiro de 1989 (períodos dos Planos Bresser e Verão) é que sofreriam a remuneração pelos índices de 26,06% para junho de 1987 e 42,72% para janeiro de 1989.

Decidiu, ainda, com relação ao Plano Collor, que “os saldos existentes nas cadernetas de poupança, inferiores a NCz$ 50.000,00, iniciadas ou renovadas após a entrada em vigor da MP 168/90, posteriormente convertida na Lei 8.024/90, não fazem jus à aplicação do IPC de abril de 1990”, pois este seria o posicionamento já sedimentado do STJ sobre o tema.

Após o trânsito em julgado da decisão, o autor deu início ao cumprimento de sentença, apresentando seus cálculos que, em 30 de setembro de 2009, somavam mais de treze milhões de reais, pois acrescia aos cálculos os índices da sentença dos planos Collor I e II sobre os saldos bloqueados pelo Banco Central do Brasil em 1990.

Para tanto, alegou que o trecho da sentença que dispôs que “os saldos existentes nas cadernetas de poupança, inferiores a NCz$ 50.000,00, iniciadas ou renovadas após a entrada em vigor da MP 168/90, posteriormente convertida na Lei 8.024/90, não fazem jus a aplicação do IPC de abril de 1990” lhe teria concedido o direito de pleitear, inclusive, os índices da sentença sobre os valores bloqueados pelo Banco Central do Brasil.

A instituição financeira ré apresentou impugnação ao cumprimento de sentença, arguindo o excesso de execução, que decorria da inclusão indevida, nos cálculos da condenação, de índices de correção incidentes sobre recursos bloqueados em Cruzados Novos nas contas de Depósito Especial Remunerado (DER), sob custódia do BACEN.

Em razão da divergência dos cálculos apresentados pelas partes, foi realizada perícia judicial, com apresentação de laudos por dois peritos distintos.

Em ambos os laudos, os peritos judiciais acataram a metodologia de cálculo utilizada pelo autor e fizeram incidir os índices do IPC sobre os saldos de depósito especial remunerado bloqueados pelo Banco Central do Brasil, que não se encontravam, portanto, sob a custódia da instituição financeira.

Ao analisar a impugnação ao laudo pericial, apresentada pela instituição financeira, o juiz monocrático concluiu ter havido erro material na sentença, “que mencionou, baseando-se em entendimento do STJ, que os saldos existentes nas cadernetas de poupança, inferiores a NCz$ 50.000,00, iniciadas ou renovadas após a entrada em vigor da MP 168/90, posteriormente convertida na Lei 8.024/90, não fazem jus a aplicação do IPC de abril/1900”,  uma vez que a orientação jurisprudencial é no sentido contrário.

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Assim, determinou que fosse observado nos cálculos periciais o que foi decidido em recurso repetitivo pelo Superior Tribunal de Justiça, ou seja, que os valores até NCz$ 50.000,00 é que deveriam receber a correção imposta pela sentença e que os que superavam tal patamar (transferidos, portanto, ao Banco Central) não deveriam ser incluídos nos cálculos.

O autor interpôs agravo de instrumento contra esta decisão, afirmando que a decisão do juiz de primeiro grau infringiria os arts. 468, 471, 473 e 474 do CPC, porque ofenderia a coisa julgada.

Em resposta, a instituição financeira ré arguiu erro da interpretação dada pelo autor, de que a sentença que formou a coisa julgada teria admitido a aplicação do IPC sobre os saldos de depósito especial remunerado, bloqueados pelo Banco Central, seja porque tal comando não constou nem de sua fundamentação e nem de seu dispositivo seja porque a interpretação do título executivo judicial deve ser feita em seu conjunto.

Além disso, observou que, ainda que exista o erro material da redação do parágrafo que tratou do Plano Collor, este mesmo parágrafo também determinou seguir a orientação consolidada do STJ a respeito do tema, que, desde a época em que foi prolatada a sentença, já determinava a exclusão da responsabilidade das instituições financeiras de remunerar com o IPC os saldos bloqueados pelo BACEN.

Destacou, ainda, que o erro material pode ser sanado a qualquer momento e grau de jurisdição, se perceptível à primeira vista, como no caso concreto, o que resulta na não obrigatoriedade de a instituição financeira ré pagar ao autor o IPC sobre os saldos das cadernetas de poupança bloqueados pelo BACEN.

Ao julgar o recurso, a Décima Câmara de Direito Privado do TJSP negou provimento ao recurso do autor da ação, reconhecendo que houve erro material na sentença e que, segundo a orientação do STJ no julgamento do recurso especial nº 765.566-RN (de relatoria do Min. Luiz Fux, julgado em 13.5.2008, e publicado no DJe de 19.6.2008), este erro não é atingido pela coisa julgada, podendo ser corrigido a qualquer tempo.

Concluiu o acórdão, portanto, ser correta a decisão judicial monocrática que admitiu a correção apenas dos valores até NCz$ 50.000,00 (cinquenta mil cruzados novos), mantidos nas contas do autor, sem a inclusão nos cálculos dos valores que foram transferidos ao Banco Central, que excederam os  NCz$ 50.000,00 (cinquenta mil cruzados novos).

Contra o acórdão, o autor opôs embargos de declaração, que aguardam julgamento.

Para saber mais, confira a íntegra da decisão.

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