Os impasses do controle na aplicação dos precedentes 

Após o advento do CPC/2015 o sistema de precedentes ganhou lugar de destaque tanto na academia quanto na jurisprudência e na prática forense, trazendo bases dogmáticas para a elaboração de uma teoria a respeito da formação, da aplicação, da força normativa conferida a alguns tipos de precedentes bem como as técnicas imprescindíveis para a sua correta aplicação (distinguishing e o overruling, por exemplo). 

Aqui, cabe a pergunta:  qual seria o objetivo de um precedente judicial? Espera-se que haja previsibilidade das relações jurídicas, ou seja, que um molde colhido de decisão judicial proferida em um caso anterior sirva de parâmetro para o julgamento de outro caso no presente. 

Controle de aplicabilidade dos precedentes 

Algumas vias são utilizadas para o controle de aplicabilidade dos precedentes, a saber:  embargos de declaração, ação rescisória, técnica do julgamento-alerta, agravo em recurso especial e extraordinário, além de reclamação e novo recurso especial – ou extraordinário. 

A oposição de Embargos de declaração para demonstrar a contradição externa é recomendada caso o Tribunal de origem possui decisões contrárias às do precedente do Tribunal Superior. Isso ocorre em respeito ao dever cooperativo de coerência, previsto no art. 926, o qual induziria a autorização de análise de fundamento ainda não enfrentado pelo STJ ou STF. 

O processualista Fredie Didier1 afirma que o presidente ou o vice-presidente do Tribunal a quo deveria permitir a subida ao Tribunal Superior o recurso que, ainda que este contrariasse o precedente consolidado, alegasse  a possibilidade de superação, devendo tal decisão de admissibilidade se fundamentar no artigo 489, § 1º, incisos V ou VI, do Código. 

Outro posicionamento possível é o cabimento da ação rescisória contra a decisão, transitada em julgado, a fim de rescindir a referida decisão que não reconheceu os argumentos suscitados para a superação do precedente. 

Já a técnica do julgamento-alerta consiste na indicação pelo Tribunal Superior aos Tribunais inferiores que o precedente enfraqueceu e que há chances de superação futura.  

O cabimento do Agravo em recurso especial e extraordinário contra decisão que negar provimento ao agravo interno teria fundamento nos termos do artigo 1.042, para permitir acesso ao STJ ou STF. 

Outro ponto a ser levantado é o cabimento de reclamação contra a decisão a ser aplicada   à tese jurídica ao caso concreto. . Há quem defenda que o cabimento de reclamação para superação de tese adotada por Tribunal Superior e firmada em repercussão geral ou em recurso repetitivo não encontraria respaldo no ordenamento jurídico, uma vez que o cabimento da reclamação compreende a aplicação indevida da tese jurídica e sua não aplicação aos casos que a ela correspondam referem-se aos incisos III e IV, art. 988, parágrafo 4º, CPC. 

Soma-se a isso o fato de que,  no julgamento da Reclamação nº 36.476, de Fevereiro/2020, o STJ afirmou que reclamação não é via adequada para controle de aplicação de tese de recurso repetitivo, considerando “a própria dinâmica do sistema de julgamento de precedentes qualificados, no qual os tribunais superiores definem as teses que devem ser seguidas e aplicadas pelas instâncias ordinárias, de forma que seria indevido o uso da reclamação – ação autônoma que inaugura nova relação processual – em vez do sistema recursal, ressalvada a via excepcional da ação rescisória”. 

Por fim, discute-se o cabimento de interposição de novo recurso especial ou extraordinário como último mecanismo de eventual superação de seu precedente.  Tal posicionamento é divergente quanto ao fundamento a ser utilizado para a interposição de novo recurso especial ou extraordinário, uma vez que as normas constitucionais ou infraconstitucionais teriam sido violadas para ensejar a interposição de novo recurso. Diante disso, sugere-se, como fundamento, a negativa de vigência e contrariedade à disposição do artigo 927, §§ 2º, 3º e 4º, vez que tais dispositivos preveem a superação, enquanto técnica essencial para evitar o engessamento do direito em um sistema de precedentes. Já um novo recurso extraordinário fundar-se-ia no art. 102, III, “a”, da Constituição e com isso, a possibilidade de que seja aplicado o novo sistema normativo, sem inviabilizar o acesso às Cortes Superiores para reverem seus entendimentos. 

De outro modo, o cabimento de novo recurso extraordinário ou especial se justificaria em razão da afronta, respectivamente, aos artigos 5º, XXXV; 93, IX; e 102, caput, da Constituição; e aos artigos 489, § 1º, V; 927, §§ 1º a 4º; e 1.037, § 9º, do CPC. 

Conclusão 

Na percepção do Ministro Teori Zavascki, no voto-vista da QO no Ag 1.154.599/SP (pág ,16, parágrafo 4º, ao sistema de aplicação de precedentes não cabe a imutabilidade. 

Contudo, as alterações da Lei 13.256/2016 inviabilizaram o acesso ao STJ ou STF quando o tema é objeto de Recurso Especial ou Extraordinário analisados em sede de repetitivos e ou repercussão geral, respectivamente.  

Há quem sustente o cabimento de reclamação contra a decisão que julga o agravo interno, ao passo que há forte inclinação na aceitação de cabimento de um novo Recurso Especial ou Recurso Extraordinário contra a decisão que negou provimento ao agravo interno. 

Isto posto, embora os entendimentos quanto ao meio cabível contra decisão do agravo interno sejam diversos, curvam-se à possibilidade de que não se pode impedir a superação de precedentes e obstar o acesso aos Tribunais Superiores. 

Efetivamente, deve-se promover o cabimento de algum meio viável para superação, em última ratio, que se viabilize a alteração legislativa, a fim de que seja assegurado o cumprimento do artigo 926 sobre a uniformização de “sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente”.

Autora: Cristiane Maria Pereira 

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