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Julgamento tema 1046 pelo STF. Prevalência do acordado sobre o legislado
Supremo Tribunal Federal, em recente julgamento, realizado no último dia 2/5/2022, concluiu o julgamento do tema 1046 de repercussão geral que trata da validade de norma coletiva de trabalho que limita ou restringe direito trabalhista não assegurado constitucionalmente.
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que normas estabelecidas em acordos e convenções coletivas de trabalho devem prevalecer sobre a legislação no caso de restrição ou supressão de direito não assegurado pela Constituição Federal. O resultado do julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo em questão (ARE 1.121.633) cria jurisprudência para outros processos com questionamentos sobre a prevalência ou não do negociado sobre o legislado, uma vez que o caso foi ao pleno da Corte como tema da repercussão geral, fixando a tese nos seguintes termos:
“São constitucionais os acordos e as convenções coletivas que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis”.
Segundo informação do Supremo, existem mais de 66 mil processos sobrestados na origem (ou seja, paralisados) à espera da decisão do STF sobre o tema.
A tese vencedora no julgamento foi a do relator, ministro Gilmar Mendes, que, após sustentações orais de diversos amicus curiae – incluindo a CONSIF (Confederação Nacional do Sistema Financeiro), votou pelo conhecimento e provimento do recurso a fim de reformar o acórdão recorrido e assegurar validade da negociação coletiva de trabalho em questão.
O caso concreto trata de horas “in itinere”, com julgamento do recurso ajuizado por uma empresa em face de decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST). A Corte trabalhista negou validade de uma cláusula aprovada em negociação coletiva que, na prática, substituiu o pagamento pelo tempo gasto no deslocamento entre casa e local de trabalho, por fornecimento de transporte aos empregados. No recurso, a empresa recorrente afirmou que a decisão do TST ultrapassou o princípio constitucional da prevalência da negociação coletiva.
Em seu voto sobre o processo paradigma do tema 1.046 de repercussão geral, Mendes apresentou entendimento de que as negociações podem restringir direitos, mas ressaltou que não devem ferir patamar civilizatório mínimo, em observância do constitucionalmente previsto. Em regra, as cláusulas não podem ferir um patamar civilizatório mínimo, composto, em linhas gerais, pelas normas constitucionais, pelas normas de tratados e convenções internacionais incorporados ao direito brasileiro e pelas normas que, mesmo infraconstitucionais, asseguram garantias mínimas de cidadania aos trabalhadores.
Importante lembrar que segundo a Teoria do Conglobamento, na ocorrência de um conflito entre o que foi estabelecido na Convenção Coletiva e o Acordo Coletivo ou outro instrumento normativo deverá prevalecer algum deles no seu conjunto ou em sua totalidade. Pela Teoria, não deverá haver fracionamento. Ou seja, não é possível, simplesmente, escolher os melhores itens de cada regulamentação e juntá-los. De acordo com a teoria, os instrumentos normativos coletivos são resultados de concessões mútuas. Assim, ao afastar algum benefício, são concedidas outras vantagens a fim de compensar essa supressão.
De acordo com o Ministro, o “reconhecimento de convenções e de acordos coletivos pela Constituição Federal é forma de estímulo à negociação direta entre trabalhadores e empregadores, para que definam quais regras serão válidas para a relação trabalhista, com base em seus interesses e em sua realidade laboral”.
Mendes foi acompanhado pelos ministros André Mendonça, Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Roberto Barroso, Dias Toffoli e Carmen Lúcia. O ministro Edson Fachin abriu divergência ao avaliar como inadmissível que a negociação coletiva se sobreponha à vontade do legislador constituinte. Ele foi acompanhado pela ministra Rosa Weber, consolidando do placar do resultado em 7 a 2 pela prevalência do negociado sobre o legislado (os ministros Luiz Fux, presidente do STF, e Ricardo Lewandowski não participaram da sessão).
Ao longo da sessão de julgamento houve importante destaque ao fato de que na negociação coletiva prevalece o princípio da equivalência entre negociantes, não gerando vantagem apenas para empregadores, uma vez que a natureza sinalagmática é inerente às convenções e acordos coletivos, sendo que a ocorrência de concessões mútuas e recíprocas é ínsita ao processo de negociação propriamente dito.
Outra questão relevante posta foi no sentido de que os ajustes acordados com a chancela sindical são revestidos de boa-fé, razão pela qual sua invalidade deve ser a exceção e não a regra.
Autores:
Rodrigo de Oliveira Kaufmann