A segurança jurídica e o dissídio jurisprudencial como requisito de admissibilidade nos embargos de divergência 

Ao longo dos últimos 30 anos, o processo de globalização vem influenciando todos os setores da sociedade, alterando, também, os aspectos psicológicos e sociais entre os indivíduos. Tal fator se dá pelo alargamento do acesso à informação e à tecnologia, tornando as relações e aquisições cada vez mais padronizadas, o que, consequentemente, tornam massificadas as demandas judiciais. 

Diante do avanço do acesso à informação, os cidadãos passaram a se reconhecer como sujeitos de direitos e não somente de deveres, aumentando sua consciência jurídica. Após a Segunda Guerra Mundial, com a criação da ONU e da Declaração Universal dos Direitos Humanos, passou-se a atrair atenção aos chamados direitos de terceira geração, exigindo que as Constituições da época inovassem ao assegurar garantias como o direito ao trabalho, à saúde, à segurança material, à educação e ao acesso à justiça. 

Com a vigência do Novo Código de Processo Civil, dentre suas inovações, o legislador demonstrou interesse em novas soluções de conflitos, incentivando os cidadãos a buscarem outros meios de soluções que não o Estado, como a conciliação e a arbitragem. Para além disso, a fim de evitar a sobrecarga do Poder Judiciário, se fez necessária a criação de mecanismos capazes de trazerem para a sociedade soluções eficazes, evitando a eterna recorribilidade e morosidade para a solução de litígios e, nesse ponto, mecanismos como o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas e os recursos repetitivos, inclusive evitando a discrepância entre decisões no mesmo ordenamento jurídico. 

Nesse cenário, a “justiça social” ganhou impulso e um exemplo claro no Brasil foi a criação do Código de Defesa do Consumidor, Lei 8.078/90 e a Lei da Ação Civil Pública, nº 7.347/85.  

Diante da explícita necessidade de decisões judiciais mais “justas”, fez-se necessário garantias processuais a fim de impedir decisões conflitantes entre si para situações de direito materiais ou fáticas semelhantes ou iguais.  

Segurança jurídica e Estado Democrático de Direito 

A segurança jurídica pode ser entendida como a situação na qual os litigantes, após solução de sua lide, sentem-se estáveis com o quanto decidido, seja favoravelmente, ou não, inclusive tendo a garantia de que a solução da lide já delimitou a eventual condenação em relação ao objeto litigioso, assegurando ao condenado a possibilidade de arcar com sua condenação sem posteriores surpresas.  

Entende-se que a segurança jurídica está diretamente interligada com os princípios da previsibilidade e da coerência na aplicação das leis, seja no presente momento da discussão da lide ou no futuro quando da sua solução e/ou consequências.  

Buscando a coerência do ordenamento jurídico, o Código de Processo Civil de 2015 em seus artigos iniciais trouxe para o direito processual a principiologia também constante na Constituição Federal, como é o caso da segurança jurídica prevista no art. 5º inciso XXXVI, o qual exige observância ao aspecto objetivo da estabilidade das normas jurídicas, mas também dos aspectos subjetivos da proteção à confiança ou confiança legítima, acolhidos do direito alemão e objetivando a boa-fé do cidadão e do Estado para com as normas jurídicas. 

Por outro lado, a insegurança jurídica desestimula os cidadãos a buscarem a solução da lide ou ao buscá-la não se sentirem satisfeitos com a decisão transitada em julgado, trazendo como consequência, dentre outras, a contínua judicialização das situações cotidianas ou a interposição de recursos objetivando a reforma da decisão. 

Conforme entendimento do Ministro Luiz Fux, é possível observar a relevância da segurança jurídica, também, ao se falar em eficácia da lei no tempo, ou seja, o Código de Processo Civil, ao entender pela aplicação imediata da lei processual, respeitando o seu prazo de vacatio legis, não poderá deixar de observar os direitos adquiridos, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Portanto, embora seja evidente a natureza dinâmica da relação processual, esta nunca poderá ultrapassar a segurança jurídica das partes. 

Um exemplo claro na prática em que há estrita observância ao princípio da segurança jurídica se dá em situação de decisão que contemple a condenação em honorários sucumbenciais ao vencedor. Caso venha a surgir nova lei que extingue a sucumbência em tal categoria de ação, o direito subjetivo aos honorários sucumbenciais segundo a lei vigente ao tempo da decisão deverá ser mantido frente à nova legislação. Tal característica demonstra a intenção do legislador em evitar a surpresa na inovação da legislação que possa a vir a prejudicar as partes.  

Mais uma vez é possível evidenciar a intenção do legislador em garantir a segurança jurídica na medida em que, para os recursos interpostos sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, somente será aplicável o Código de Processo Civil de 2015 quando a lei for benéfica às partes, como por exemplo a fungibilidade entre os recursos especial e extraordinário. 

Para haver segurança jurídica, é esperado: i) clareza nas decisões judiciais; ii) estabilidade das decisões transitadas em julgado; iii) respeito às decisões anteriores; iv) uniformização das decisões colegiadas, especialmente dos Tribunais Superiores.  

Ainda, a segurança jurídica traz para a sociedade a estabilidade das relações de direitos e deveres também com auxílio dos princípios do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada. 

Nesse sentido é o entendimento do Ministro Humberto Martins que, em seminário sobre Segurança Jurídica e Desenvolvimento Econômico, destacou: “A segurança jurídica é a estabilidade, a permanência das decisões. É isso que faz diariamente o STJ. Quando o Tribunal dá essa segurança ao jurisdicionado, ele não pode estar a cada momento mudando de opinião. Isso é o que provoca instabilidade”. O Ministro defendeu a necessidade da prevalência da segurança jurídica enquanto valor do próprio Estado Democrático, citando os mecanismos do direito brasileiro que visam à uniformização e previsibilidade da justiça, como o sistema de repercussão geral do Supremo Tribunal Federal (STF) e o de recursos repetitivos do Superior Tribunal de Justiça (STJ).  

Para a observância da segurança jurídica como garantidora do Estado Democrático de Direito, o Superior Tribunal de Justiça, desde sua instalação, vem elaborando súmulas, porém sem caráter vinculante. Com o Código de Processo Civil de 1973 introduziu-se a possibilidade de o Presidente do Tribunal, ao observar a multiplicidade de decisões sobre o mesmo tema, admitir um ou mais recursos representativos da controvérsia, os quais seriam encaminhados ao STJ, ficando suspensos os demais recursos especiais até o seu pronunciamento definitivo, conforme inteligência do art. 543-C, CPC/73. Tal medida seguiu-se com o Código de Processo Civil de 2015, conforme previsão dos artigos 927 e 975. De todo modo, tanto em sua origem quanto atualmente, o Superior Tribunal de Justiça suporta a condição de privilegiar a segurança jurídica das decisões proferidas, dispondo para tanto de instrumentos de uniformização. Nessa perspectiva, o STJ vem formulando teses, chamadas de “Jurisprudência em Teses” ou simplesmente “orientações do STJ”, as quais visam a se tornar orientações a serem seguidas pelos tribunais pátrios como parâmetro para decisões futuras, garantindo ampla divulgação e buscando proteção contra decisões conflitantes. 

Procedimento dos Embargos de Divergência e seu papel na segurança jurídica das decisões conflitantes 

Em breve retrospecto histórico, a finalidade característica do recurso de embargos de divergência vem sendo explorada pelo legislador desde o Código de Processo Civil de 1939, sob o entendimento da impossibilidade jurídica da existência de decisões divergentes em uma mesma turma julgadora. Porém, os embargos de divergência somente passaram a ter previsão expressa e sistematizada de seu procedimento e requisitos de admissibilidade no Código de Processo Civil de 2015. Sendo cristalina a necessidade de que o jurisdicionado encontre nos Tribunais Superiores interpretação clara e uniforme da legislação, o recurso de embargos de divergência se mostrou primordial. 

Na vigência do Código de Processo Civil de 1973, foi implementada a sistemática de recursos repetitivos, por meio da Lei 11.418/2006 a qual inseriu o artigo 543-B no mencionado CPC e, posteriormente, foi promulgada a Lei 11.672/2008, a Lei dos Recursos Repetitivos visando evitar a imposição de recursos sobre questões já decididas no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, visando à coerência das decisões e evitando o acúmulo de ações que versassem sobre matéria já decidida, fortalecendo, assim, a utilização de precedentes no sistema jurídico brasileiro. 

Com previsão na Seção IV do Capítulo VI do Código de Processo Civil, Dos Recursos Para o Supremo Tribunal Federal e Para o Superior Tribunal de Justiça, os embargos de divergência visam à uniformização da jurisprudência interna, contribuindo com o estado democrático de direito, trazendo coerência e previsibilidade dentro do mesmo tribunal, promovendo, assim, a segurança jurídica. O recurso encontra parâmetro processual no sistema de precedentes, os quais justificam os princípios da segurança jurídica, isonomia e eficiência, buscando-se a previsibilidade do direito aplicado e, consequentemente, com a possível antecipação da aplicação da norma, evitando até a judicialização de demandas “perdidas”.  

No entendimento do jurista Gilberto Gomes Bruschi “os embargos de divergência possuem a função de afastar dispersão jurisprudencial interna dos tribunais de vértice, portanto não se admite como paradigma para demonstrar a divergência, acórdão publicado por tribunal diverso daquele que proferiu a decisão contra a qual se insurge o embargante”. Sendo assim, nítida a função pacificadora do recurso de embargos de divergência, a fim de garantir a inexistência de decisões conflitantes de órgãos fracionários dos tribunais superiores. Ou seja, o recorrente ao opor embargos de divergência busca a coerência interna do Tribunal objetivando que seja mantido o padrão das decisões. 

O procedimento do recurso de embargos de divergência apresenta peculiaridades que deverão ser observadas para que o recorrente alcance o objetivo de que seja discutida e fixada a tese a ser definida entre o acórdão embargado e o acórdão paradigma. Conforme será elucidado a seguir, em atenção aos requisitos de admissibilidade dos embargos de divergência, deverá o recorrente comprovar a discrepância entre os julgados para que a discussão seja ou não acolhida.  

Inicialmente, destaca-se que não há previsão no Código de Processo Civil ou nos Regimentos Internos dos Tribunais Superiores que delimitem a matéria que poderá ser julgada em sede de embargos de divergência, de modo que, tanto questões de direito material, quanto de direito processual poderão ser objeto de embargos de divergência. No entanto, existem exceções a tal premissa, como quando a matéria discutida for em relação ao valor fixado para danos morais. Entende-se que a matéria de dano moral não poderá ser discutida em sede de embargos de divergência devido à sua natureza questionável a depender de diversas questões sociais e psicológicas que envolvem o caso concreto, como isso, não haveria tese jurídica em eventual divergência de decisões no que se refere ao dano moral, uma vez que a divergência seria meramente na fixação de um valor, o qual depende exclusivamente das particularidades do caso concreto, não havendo como confrontar acórdãos que justifiquem a interposição do recurso de embargos de divergência.  

A divergência justificadora da oposição dos embargos pressupõe julgados proferidos por órgãos diversos, conforme dispositivo do RISTJ (art. 266, “caput”), inclusive é a inteligência do artigo 1.044 do CPC, que adverte a observância do procedimento estabelecido no regimento interno do respectivo tribunal superior em sede de embargos de divergência. Assim, quando houver divergência em órgãos distintos, será necessário comprovar a similitude fático-jurídica entre os arestos comparados, isso inclusive considerando o artigo 1.043, I, CPC. 

Os embargos de divergência são considerados recursos de fundamentação vinculada, uma vez que, para seu cabimento, a lei exige a ocorrência de falha na observância da jurisprudência ou reste caracterizada a sua indefinição, ou seja, quando, apesar de tratarem do mesmo objeto e aplicarem a mesma legislação, houver divergência a respeito da fixação de tese jurídica no Tribunal.  

Os embargos de divergência não se confundem com o IRDR, tendo em vista sua natureza recursal; também não se confundem com recursos especial e extraordinário, pela finalidade de eliminar contradição dentro do próprio Tribunal. Portanto, os embargos de divergência, conforme artigo 1.043 do CPC, exigem a demonstração de divergência jurisprudencial entre os órgãos fracionários. 

Em sua natureza recursal, o requisito da admissibilidade nos embargos de divergência se apresenta na prática como um grande desafio quando comparada à admissibilidade de outros recursos, isso porque, para além dos requisitos previstos para todos recursos, como a tempestividade, demonstração de legitimidade e interesse recursal, recolhimento do preparo e demais regularidades formais,  assim  como   a  inexistência  de  qualquer  fato  impeditivo  ou  extintivo  do  direito  de recorrer bem como observar o regimento interno do respectivo Tribunal Superior, deve-se demonstrar e comparar as teses jurídicas diversas que apresentaram a divergência no tribunal, trazendo as semelhanças nas realidades fáticas.  

Diante disso, para a sua admissibilidade, se faz necessária, inicialmente, a atualidade da divergência, devendo seguir as disposições do parágrafo §4º, artigo 1.043, CPC e o artigo 266, parágrafo 4º, do Regimento Interno do STJ, sendo indispensável a comprovação da alegada divergência jurisprudencial, não bastando a mera transcrição da divergência, se fazendo necessário adotar uma das seguintes providências, conforme entendeu a Corte Especial no julgamento do EAREsp 1.521.111: a) juntada de certidões; b) apresentação de cópias do inteiro teor dos acórdãos apontados; c) citação do repositório oficial, autorizado ou credenciado em que os julgados estiverem publicados, inclusive em mídia eletrônica; e d) reprodução de julgado disponível na internet, com a indicação da respectiva fonte on-line. Observa-se que a indicação do Diário de Justiça em que publicado o acórdão paradigma não se faz suficiente para demonstrar a divergência, conforme entendeu o STJ no julgamento do AgInt nos EAREsp 1.935.286-RJ, de relatoria do Ministro João Otávio de Noronha. 

Frisa-se que os embargos de divergência visam a solucionar eventual problema interno dos Tribunais Superiores, auxiliando, assim, a eficiência da justiça. No entanto, embora seja de grande importância, o recurso de embargos de divergência, conforme destacado, impõe situações específicas, as quais devem ser observadas para sua admissibilidade. Assim, embora o parágrafo único do art. 932 do CPC conceda ao recorrente o prazo de 5 dias para sanar vício antes que o relator inadmita o recurso, tal permissivo vem sendo afastado nos embargos de divergência, para os quais se faz mister a indispensável demonstração do dissídio na petição do recurso, como apontado pelo Ministro Jorge Mussi, tratando-se de vício substancial e não de vício estritamente formal. 

A divergência justificadora da oposição dos embargos pressupõe julgados proferidos por órgãos diversos, conforme dispositivo do Regimento Interno do STJ (artigo 266, “caput”), que deve ser observado por força do artigo 1.044 do CPC. Será necessário comprovar a similitude fático-jurídica entre os arestos comparados, nos termos do artigo 1.043, I, CPC.  

Considerando a finalidade do recurso, os embargos de divergência não se prestam à reanálise processual, de modo que se faz necessária a clara confrontação analítica dos acórdãos, com a finalidade de demonstrar quais as circunstâncias fático-processuais estão em conflito. Consequentemente, pode se considerar que a divergência é o elemento autorizativo essencial para a oposição dos embargos de divergência buscando, assim, garantir a efetividade da tutela do direito pleiteado. 

Conforme análise jurisprudencial, é possível averiguar que muitos embargos de divergência não ultrapassam a fase de admissibilidade, sendo barrados antes de analisada a divergência pela falta dos requisitos destacados anteriormente. Em razão disso, frisa-se a importância de se observar a confrontação analítica de maneira clara, organizada e documentada, não sendo cabível apenas a transcrição de ementas ou quando indicado apenas a quantidade de decisões paradigmas.  

Um exemplo claro da inadmissibilidade dos embargos de divergência se dá quando há ausência de confronto analítico pelas situações aqui elencadas, mas não só, podendo ocorrer a inadmissão quando: i) observada a ausência de apreciação do mérito de recurso especial; ii) não houver similitude fática entre o acórdão recorrido e o(s) paradigma(s); iii) quando o acórdão paradigma foi proferido em ações que possuem natureza de garantia constitucional; iv) quando a jurisprudência do Tribunal se firmou no mesmo sentido do acórdão embargado, conforme Súmula 168/STJ; v) quando o acórdão paradigma for decisão monocrática; vi) quando o acórdão recorrido foi proferido em recurso especial repetitivo; dentre outras situações encontradas na jurisprudência.  

Para além das situações elencadas que acarretam a inadmissibilidade dos embargos de divergência, é comum encontrar na jurisprudência situações em que o embargante busca demonstrar que o acórdão recorrido e o acórdão paradigma mesmo que proferidos pela mesma turma julgadora merecem análise e acolhimento a fim de sanar a divergência. Isso porque, a situação apresenta-se como exceção prevista no artigo 1.043, §3º, CPC, o qual dispõe serem cabíveis embargos de divergência quando o acórdão paradigma for da mesma turma que proferiu a decisão embargada se houver ocorrido alteração na composição da Turma julgadora em mais de metade de seus membros. Para que os embargos de divergência possam ser admitidos diante da exceção prevista no Código de Processo Civil, deve o embargante demonstrar documentalmente que a alteração na composição da Turma julgadora ocorreu entre a data de julgamento do acórdão embargado e a data de julgamento do acórdão paradigma, trazendo indícios que comprovem a alegada divergência, seguindo as peculiaridades formais indispensáveis, como, por exemplo, a juntada de certidões e, se o caso, a indicação da página do Diário de Justiça. Ou seja, o recorrente deverá socorrer-se de todos os meios comprobatórios a seu alcance objetivando a admissibilidade do recurso, seja quando invocando a exceção do artigo 1.043, §3º, CPC ou nas demais situações. 

Nesse sentido, o Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, em julgamento de agravo interno nos embargos de divergência, negou provimento ao agravo interno por entender que a mencionada exceção depende de comprovação e que um único acórdão colacionado para demonstrar divergência não preenche por si só as regras de admissibilidade dos embargos de divergência, oportunidade em que destacou que não cabe ao intérprete da lei estender para outras hipóteses de incidência não estabelecidas no § 3º do art. 1.043 do CPC/2015, por se tratar de norma restritiva. 

A discussão da admissibilidade dos embargos de divergência é tanta que buscou-se mitigar a incidência da Súmula 315/STJ, a qual previa que não caberiam embargos de divergência no âmbito do agravo de instrumento que deixa de admitir recurso especial. Segundo entendimento dos Ministros Raul Araújo, Herman Benjamin, entre outros, passaram a admitir, em sede de agravo interno, o cabimento dos embargos de divergência mesmo em situações de desprovimento de anterior agravo de instrumento ou agravo em recurso especial, somente quando a fundamentação do julgado houver examinado o mérito do recurso especial.  

A competência para julgamento dos embargos de divergência está prevista no Regimento Interno dos Supremos Tribunais, dessa forma, para sua admissibilidade será necessário, também, a averiguação da competência, a qual poderá ser: i) do Plenário do Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 366 do Regimento Interno do STF; ii) da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, em caso de divergência entre as Seções deste Tribunal, conforme art. 266 do Regimento Interno do STJ ou; iii) da Seção do Superior Tribunal de Justiça, em caso de divergência entre as turmas deste Tribunal, em observância ao art. 266 do Regimento Interno do STJ. 

Finalmente, preenchidos os requisitos de admissibilidade, o embargado será intimado para impugnar os embargos de divergência, no prazo de 15 dias, conforme previsto pelo art. 1.003, §5º, CPC. Paralelamente, o prazo para interposição de recurso extraordinário será interrompido para ambas as partes. 

Quando houver recurso extraordinário por qualquer das partes, que tenha sido interposto anteriormente à oposição dos embargos de divergência, haverá o processamento do recurso extraordinário independentemente da sorte dos embargos de divergência.  

Após a impugnação, os autos serão levados a julgamento no colegiado, oportunidade em que será reexaminado os requisitos de admissibilidade, para então conhecer ou não do recurso, ao observar a existência ou inexistência de divergência atual, conforme destacado a pouco.  

Na sequência, dar-se-á, se o caso, provimento ao recurso, oportunidade em que será definida a aplicabilidade da tese da decisão embargada ou da decisão paradigma. Em caso de provimento dos embargos de divergência, eventual recurso extraordinário perderá seu objeto.   

Reconhecida a divergência, o Tribunal fixará a tese jurídica entendendo qual deverá prevalecer, pacificando o entendimento e aplicará ao caso concreto, podendo, inclusive, cassar o acórdão embargado ou paradigma e julgar a matéria novamente. 

Não há efeito suspensivo automático no recurso de embargos de divergência, devendo esse, se o caso, ser requerido em petição própria dirigida ao relator, o qual avaliará se presentes os requisitos para a concessão do efeito suspensivo nos termos do artigo 995, parágrafo único do CPC, sendo necessária a demonstração de risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação e ficando demonstrada a probabilidade de provimento do recurso, ou seja, aplicar-se-á a regra geral para a concessão de efeito suspensivo. Os embargos de divergência se munem de efeitos obstativos, obstando a formação da coisa julgada diante de suposta divergência de órgão fracionário, bem como, de efeito devolutivo. 

Conclusão 

Conforme elucidado no presente artigo, a segurança jurídica se mostrou como um dos pilares defendidos pelo legislador no Código de Processo Civil de 2015, seguindo a principiologia da Constituição Federal em seu art.  5º, inciso XXXVI. Para tanto, buscando evitar decisões surpresas ou decisões conflitantes, se mostrou necessária a uniformização e previsibilidade da justiça, como com o sistema de repercussão geral do Supremo Tribunal Federal (STF) e o de recursos repetitivos do Superior Tribunal de Justiça (STJ).  

Diante deste feito, o recurso de embargos de divergência apresenta papel importante visando a pacificar as decisões de órgãos fracionários dos tribunais superiores, garantindo a inexistência de decisões conflitantes entre si. Porém, conforme demonstrado, para que o recurso de embargos de divergência seja admitido e siga seu processamento até posterior provimento, a fim de que seja definida a aplicação da tese da decisão embargada ou da decisão paradigma, ocorrerá estrita avaliação para sua admissibilidade.  

Por ser considerado um recurso de fundamentação vinculada, a admissibilidade dos embargos de divergência impõe situações específicas, principalmente a atualidade da divergência demonstrada, a qual deverá ser comprovada, não bastando a mera transcrição. Logo, visando a admissibilidade do recurso de embargos de divergência deve-se observar estritamente os requisitos destacados.  

Dentro desse aspecto, embora existam formalidades próprias para a admissibilidade do recurso de embargos de divergência, conforme demonstrado, sua essencialidade está na importância da demonstração da divergência, isso porque, diante de divergência ocorrerá a insegurança jurídica da aplicação das normas de direito processual e material, sendo este recurso indispensável para o atendimento da principiologia constante no Código de Processo Civil de 2015 e na Constituição Federal.  Uma vez demonstrado, documentalmente, pelo embargante que o acórdão embargado inovou ao trazer tese antagônica que o prejudica, deverá ser analisada a existência de outros acórdãos em sentido diverso, uniformizando o entendimento e pacificando a tese discutida para que, assim, mantenha-se a segurança jurídica e a harmonia das teses proferidas. 

Autora: Luciana Alfeld Silvestre  

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