Os limites da coisa julgada em execução de sentença proferida em ações civis coletivas em âmbito trabalhista 

Sabe-se que a coisa julgada revela a estabilidade das decisões judiciais, e possui proteção constitucional, além de constituir expressão no campo do direito processual civil do princípio da segurança jurídica, cujo fundamento reside na própria ideia de Estado Constitucional.

Nele, ou seja, no âmbito constitucional, observa-se um dos pilares norteadores da edição de normas legais pelo constituinte derivado, o qual reside na observância à coisa julgada, que ostenta status de garantia constitucional, com se observa da leitura do inciso XXXVI do art. 5º, da Constituição Federal. [1]

Na seara processual, pode-se afirmar que, nas questões resolvidas em decisões cujo julgo seja o mérito da causa, em um determinado espaço de tempo e abarcando determinadas pessoas, a coisa julgada se tornará imutável e indiscutível as matérias ali discutidas.

Ela está intimamente ligada ao esgotamento das possibilidades recursais previstas no ordenamento jurídico e, com isso, opera o trânsito em julgado, o que torna definitiva a decisão que enfrentou os temas tratados no processo judicial.

Entretanto, cabe o destaque de que a coisa julgada outorga proteção à parte dispositiva da decisão de mérito que transitou em julgado, o que não ocorre com os motivos que ensejaram a fundamentação da decisão. Com efeito, o Código de Processo Civil (CPC) dispõe sobre a eficácia, limites e alcance dos efeitos da coisa julgada, bem como trata de situações em que esta pode ser revista, como consta do artigo 505, incisos I e II, do CPC.

No aspecto do direito processual do trabalho – que será o escopo do presente texto – há que se observar o lapso prescricional estabelecido no art. 7º, inciso XXIX, da CF e art. 11 da CLT, estando limitado os efeitos da coisa julgada ao prazo prescricional indicado nos referidos dispositivos.

No entanto, ao que concerne às ações civis coletivas, a coisa julgada se forma por meio de sentença genérica, cabendo aos indivíduos por ela atingidos pleitearem a eficácia do título executivo ou se fazendo substituir pelos legitimados a propor ações de natureza coletiva.

As ações civis coletivas desempenham um papel crucial no sistema jurídico, permitindo a defesa de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos. Contudo, o conceito de coisa julgada, que visa a conferir estabilidade e segurança jurídica, apresenta desafios quando aplicado a essas demandas coletivas.

O presente texto visa identificar os limites da coisa julgada no âmbito de ações de natureza jurídica coletiva, analisando as tensões entre a segurança jurídica e a necessidade de tutelar interesses amplos da sociedade, bem como sua observância na fase executória das sentenças proferidas, à luz da análise de caso concreto. 

Os limites da coisa julgada 

Os limites da coisa julgada podem ser observados sob o prisma objeto e subjetivo. No tocante ao aspecto objetivo, o Código de Processo Civil estabelece que a decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida.  

É importante ressaltar que, quando se trata dos limites da coisa julgada, não se pode olvidar que as regras tanto processuais quanto de processamento de qualquer demanda judicial devem ser seguidas por aqueles que litigam em juízo.  

Nesse aspecto, é importante destacar que, com o ajuizamento da demanda, os pressupostos de aptidão da peça exordial determinarão os efeitos da coisa julgada que, em questões individuais, terá efeito interpartes.  

Com efeito, os limites objetivos referem-se à extensão da autoridade da coisa julgada sobre o objeto da decisão. Esses limites têm implicações diretas na amplitude e na abrangência das decisões judiciais. Dentre os aspectos relevantes, destacam-se: 

Litispendência e Conexão: 

   A coisa julgada não pode ultrapassar os limites do que foi objeto da demanda inicial. Caso haja litispendência (duas ações em andamento sobre o mesmo objeto) ou conexão entre processos, é imperativo que a coisa julgada não extrapole os limites delineados na primeira demanda. 

Extensão Subjetiva: 

   A coisa julgada deve atingir apenas as partes envolvidas na demanda original. Terceiros que não participaram do processo não devem ser afetados pela autoridade da coisa julgada, preservando-se seus direitos e ações futuras. 

Tempo e Mutabilidade dos Fatos 

  A coisa julgada não pode abarcar fatos supervenientes ao processo ou que não foram discutidos devidamente durante a ação. A dinâmica das relações jurídicas ao longo do tempo pode demandar revisões, e a coisa julgada não deve impedir a adequação das decisões a novos cenários.[2] 

No tocante ao aspecto temporal, é fator determinante para a discussão dos efeitos da coisa julgada e de sua extensão aplicar, especificamente para ações civis coletivas ajuizadas na esfera da Justiça do Trabalho, os ditames dos artigos 7º, inciso XXIX, da CF e artigo 11 da CLT, com redação dada pela Lei 13.467/17 (Reforma Trabalhista): 

Os pedidos decorrentes de relação de trabalho estão sujeitos ao prazo prescricional estabelecido nos referidos dispositivos legais, os quais lecionam: 

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: 

XXIX – ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho; 

Art. 11.  A pretensão quanto a créditos resultantes das relações de trabalho prescreve em cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho. 

Quando se trata dos efeitos da coisa julgada em ações civis coletivas na seara da Justiça Especializada, há que se observar os limites estabelecidos nos artigos acima em leitura conjunta com os limites subjetivos da referida coisa julgada, os quais balizam a interpretação do título executivo.  

Em sentido amplo, os limites subjetivos, por sua vez, referem-se à proteção dos direitos e interesses das partes envolvidas na demanda original. Essa dimensão dos limites da coisa julgada envolve: 

a. Efeito Erga Omnes: 

   A coisa julgada produz efeitos erga omnes, ou seja, tem eficácia contra todos. Contudo, essa eficácia não pode prejudicar direitos fundamentais, e a coisa julgada deve ser aplicada com razoabilidade, evitando-se injustiças. 

b. Revisão em Casos de Nulidade e Anulabilidade: 

   Quando a decisão é nula ou anulável, os limites subjetivos da coisa julgada podem ser revistos. A preservação da segurança jurídica não pode justificar a manutenção de decisões que, por vícios processuais, merecem ser invalidadas. 

c. Possibilidade de Modificação ou Revogação: 

   Em casos excepcionais, nos quais novas provas surgem ou a interpretação do direito se altera, a coisa julgada subjetiva pode ser objeto de revisão. Isso é crucial para evitar a perpetuação de injustiças resultantes de decisões que, posteriormente, revelam-se inadequadas. 

Não por menos, o Código de Processo Civil dedica uma sessão de seu diploma para tratar dos aspectos inerentes à coisa julgada e sua aplicação no ordenamento jurídico: 

Seção V 
Da Coisa Julgada 

 Art. 502. Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso. 

 Art. 503. A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida. 

(…) 

 Art. 505. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide, salvo: 

I – Se, tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença; 

II – Nos demais casos prescritos em lei. 

 Art. 506. A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não prejudicando terceiros. 

 Art. 507. É vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão. 

 Art. 508. Transitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido. 

Portanto, a busca por um equilíbrio entre a estabilidade das decisões judiciais e a necessidade de adaptação a novos contextos é constante. A compreensão e respeito desses limites no âmbito do sistema jurídico promove não apenas segurança jurídica, mas também justiça e eficácia na tutela dos direitos individuais e coletivos. 

A coisa julgada formada no âmbito das ações civil coletivas 

Inicialmente, é mister compreender a natureza jurídica da coisa julgada e como esse instituto é aplicável nas ações civis coletivas. Como visto, a coisa julgada, consagrada como princípio do sistema jurídico, tem por escopo garantir a estabilidade das decisões judiciais, impedindo a reabertura de discussões já encerradas.  

Entretanto, quando aplicada às ações coletivas, surge a necessidade de equilibrar essa estabilidade com a proteção dos interesses difusos da coletividade. 

As ações civis coletivas estão previstas na Lei 7.347/85, que estabelece regras gerais para a tutela de direitos coletivos difusos e individuais homogêneos, sendo este último, definido no artigo 81, da Lei 8078/90, a qual estabelece que: 

 Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo. 

        Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de: 

        I – Interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato; 

        II – Interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base; 

        III – interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum. 

No presente texto, verificaremos a hipótese do inciso III, do dispositivo acima mencionado, acerca dos efeitos da coisa julgada bem como  a interpretação do título executivo formado por sentença genérica em sede de ação civil coletiva. 

A interpretação do título executivo e os parâmetros de execução do título executivoformado em ações civis coletivas na esfera trabalhista  

No direito processual do trabalho, ação civil coletiva, tendo como objeto direitos individuais homogêneos, de origem comum, tem como escopo principal a reparação dos danos sofridos pelos trabalhadores individualmente considerados. Quando da sentença, o juiz definirá a responsabilidade do réu pelos referidos danos. A sentença, no entanto, assumirá uma conotação diferenciada, semelhante a uma decisão com efeitos diferidos no tempo, ou seja, tão somente na fase de execução é que será determinada a extensão dos danos e a determinação exata dos valores da condenação, em relação a cada trabalhador, para posterior execução. 

Assim, a coisa julgada formada nas ações civis coletivas na esfera trabalhista está sujeita à interpretação do título executivo e sua “ratio decidendi”. É cediço que a simples interpretação do título e a busca pela efetividade do direito coletivo por ele declarado não enseja violação ao instituto da coisa julgada.  

Nesse sentido, tanto o Superior Tribunal de Justiça (STJ), quanto o Tribunal Superior do Trabalho (TST), possuem posicionamento consoante o exposto. Como se observa de alguns julgados abaixo: 

I – AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.015/2014. EXECUÇÃO. INTERVALO INTRAJORNADA. INTERPRETAÇÃO DO TÍTULO EXECUTIVO. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DA COISA JULGADA. O entendimento adotado pelo Tribunal Regional é fruto de exame e interpretação dos termos da decisão exequenda, circunstância que impossibilita a configuração de ofensa literal e direta ao art. 5.º, XXXVI, da CF. Com efeito, a diretriz que se extrai da Orientação Jurisprudencial 123 da SBDI-2 do TST (analogicamente) é de que a ofensa à coisa julgada supõe dissonância patente entre as decisões exequenda e rescindenda, o que não se verifica quando se faz necessária a interpretação do título executivo judicial para se concluir pela lesão à coisa julgada, tal como na hipótese dos autos. Não merece reparos a decisão agravada. Precedentes do STF. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (…) [5] 

EMENTA DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. COISA JULGADA. APLICABILIDADE DE COMPENSAÇÃO DE VALORES DO QUE DEVIDO PELO BANCO DO BRASIL COM O QUE FOI PAGO PELA PREVI. ÓBICE À DUPLA COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA E AO CONSEQUENTE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. 

1. Na hipótese em epígrafe, a sentença proferida na fase de conhecimento aponta que a PREVI apenas assegurou o que era devido pelo Banco do Brasil e que a complementação sob responsabilidade da instituição financeira somente seria devida se necessário, caso o benefício de natureza complementar pago pela PREVI não equivalesse ao montante prometido no contrato de trabalho. 

2. Por conseguinte, o caso concreto trata de compensação do que tem de ser devolvido pelo Banco do Brasil com o que foi pago pela PREVI para obstar uma dupla complementação de aposentadoria, o que infringe o teor do art. 884 do CC. 

3. Não ocorrência de ofensa à coisa julgada por meio da interpretação do título executivo judicial que guarda maior pertinência com o sistema jurídico, de acordo com o princípio da razoabilidade, afastando a que leve a resultados visivelmente indesejados, sobretudo o enriquecimento ilícito. 

Recurso especial provido. [6] 

Vê-se que o próprio TST já sedimentou em suas orientações jurisprudenciais – as quais norteiam o processo do trabalho, bem como os entendimentos sumulados – definiu exatamente que a mera interpretação dos títulos executivos não ofende a coisa julgada. É o que leciona a Orientação Jurisprudencial n.º 123, da Subseção II de Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho: 

123. AÇÃO RESCISÓRIA. INTERPRETAÇÃO DO SENTIDO E ALCANCE DO TÍTULO EXECUTIVO. INEXISTÊNCIA DE OFENSA À COISA JULGADA 
O acolhimento da ação rescisória calcada em ofensa à coisa julgada supõe dissonância patente entre as decisões exequenda e rescindenda, o que não se verifica quando se faz necessária a interpretação do título executivo judicial para se concluir pela lesão à coisa julgada. 

Não é demais mencionar que, entre o trânsito em julgado da sentença e a execução do título executivo podem ocorrer fatos novos que influem na eventual liquidação do título, sem que isso caracterize violação ao artigo 5º, inciso XXXVI, da CF.  

Com efeito, à título de exemplificação, o Supremo Tribunal Federal, nos autos das ADIs 6021 e 5867 e ADCs 58 e 59, determinou que os créditos trabalhistas decorrentes de condenação judicial sejam atualizados pelos mesmos índices de correção monetária e de juros vigentes para as hipóteses de condenações cíveis em geral, quais sejam, a incidência do IPCA-E na fase pré-judicial e, a partir da citação, a incidência da taxa SELIC (art. 406 do Código Civil). (ADC 58, Rel. Min Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 18/12/2020, DJe 7/4/2021). 

Nesse aspecto, o acórdão da ADC 58 cuidou de modular os efeitos do julgado que, uma já que proferido em sede de controle concentrado de constitucionalidade, possui eficácia erga omnes, assim dispondo: 

8. A fim de garantir segurança jurídica e isonomia na aplicação do novo entendimento, fixam-se os seguintes marcos para modulação dos efeitos da decisão: (i) são reputados válidos e não ensejarão qualquer rediscussão, em ação em curso ou em nova demanda, incluindo ação rescisória, todos os pagamentos realizados utilizando a TR (IPCA-E ou qualquer outro índice), no tempo e modo oportunos (de forma extrajudicial ou judicial, inclusive depósitos judiciais) e os juros de mora de 1% ao mês, assim como devem ser mantidas e executadas as sentenças transitadas em julgado que expressamente adotaram, na sua fundamentação ou no dispositivo, a TR (ou o IPCA-E) e os juros de mora de 1% ao mês; (ii) os processos em curso que estejam sobrestados na fase de conhecimento, independentemente de estarem com ou sem sentença, inclusive na fase recursal, devem ter aplicação, de forma retroativa, da taxa Selic (juros e correção monetária), sob pena de alegação futura de inexigibilidade de título judicial fundado em interpretação contrária ao posicionamento do STF (art. 525, §§ 12 e 14, ou art. 535, §§ 5º e 7º, do CPC). 9. Os parâmetros fixados neste julgamento aplicam-se aos processos, ainda que transitados em julgado, em que a sentença não tenha consignado manifestação expressa quanto aos índices de correção monetária e taxa de juros (omissão expressa ou simples consideração de seguir os critérios legais). 

Note-se, portanto, que eventual sentença transitada em julgado que não observou os novos parâmetros de atualização monetária estabelecidos pelo STF, deverá ser modificada para adequar o título executivo, sendo que tal modificação não caracteriza violação à coisa julgada.  

Análise de caso 

Ainda nesse aspecto, em sede de ação civil coletiva na seara trabalhista, entendendo pelos limites da coisa julgada, é que o Tribunal Regional da 23ª Região (Mato Grosso) reconheceu a limitação da abrangência subjetiva na execução individual de sentença proferida em ação civil pública, a qual beneficia funcionários de instituição financeira com o pagamento de horas extras decorrentes do enquadramento do cargo no caput do art. 224, da CLT. 

No caso, a discussão versava sobre execução provisória individual de sentença coletiva, cuja ação que originou o título executivo foi ajuizada em 22/07/2014, em que se discutia a fidúcia de determinado cargo de instituição financeira.  

Conforme visto anteriormente, a determinação legal contida no art. 11 da CLT prevê que os créditos resultantes das relações de trabalho prescrevem em cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho, desse modo, os titulares dos créditos oriundos da sentença coletiva abarcariam os funcionários que desempenharam suas funções no cargo de 22/07/2009 a 22/07/2014, data do ajuizamento da ação coletiva.  

Em que pese a limitação indicada pelo art. 11 da CLT, o autor da ação pretendia se valer do título executivo ao argumento de que as atividades por ele exercidas seriam as mesmas à época do ajuizamento da ação coletiva, mesmo estando incontroverso que o autor exerceu o cargo de 1º/08/2017 a 1º/05/2019.  

Interessante observar que o juízo da 1ª Vara do Trabalho de Cuiabá julgou procedente a execução provisória para condenar a instituição financeira ao pagamento das 7ª e 8ª horas laboradas como extras, por considerar que a sentença coletiva não impôs qualquer limitação de efeitos, muito embora, como visto no presente texto, que os limites da coisa julgada decorrem da própria noção de Estado de Direito.  

No recurso interposto pela instituição financeira foi alegado que a decisão proferida violou a coisa julgada formada pela sentença coletiva, uma vez que os efeitos do título executivo estão limitados aos exercentes da função na data de ajuizamento da ação coletiva e aos que eventualmente permaneceram no cargo, o que não era o caso do autor da demanda – limitação subjetiva da coisa julgada, como discorrido no capítulo anterior. 

Sob essa ótica, a 1ª Turma do TRT-23, ao reconhecer que o exequente veio a exercer o cargo em 1º/08/2017, deu provimento ao recurso da instituição financeira para declarar que o autor não se submete aos efeitos da sentença coletiva proferida e declarou que: 

Embora não conste clara limitação temporal e subjetiva na sentença coletiva, seus comandos não comportam abrangência tão ampla, a ponto de alcançar até mesmo os empregados que viessem a ser admitidos futuramente e que, de forma indiscriminada, ‘um dia’ viessem a exercer a função de assistente business com submissão à jornada de oito horas diárias.[7] 

No caso em questão, houve a extinção do feito sem resolução do mérito, nos termos do art. 458, incisos IV e VI, do CPC pois, como se pode observar, não foram levados em conta os limites subjetivos e objetivos da coisa julgada.  

Com efeito, a ausência da verificação de tais balizas fatalmente culminou na criação de evidente insegurança jurídica que, no caso descrito acima, levou-se a considerar correto o fato de qualquer indivíduo que exerce o cargo em discussão, independentemente da análise do limite temporal inerente às ações trabalhistas, seria beneficiário do título executivo.  

É dizer, na liquidação individual de sentença coletiva, a parte autora deverá provar não apenas o valor que lhe é devido, mas também a existência do seu dano pessoal e o nexo causal entre o dano reconhecido na ação coletiva (principal) e a sua lesão particularizada. [8] 

Conclusão 

Diante das análises realizadas, torna-se evidente que os limites da coisa julgada nas ações civis coletivas são desafiadores e requerem uma abordagem cuidadosa. A conciliação entre a segurança jurídica e a efetividade na tutela de interesses coletivos demanda aprimoramentos no sistema jurídico. 

Não se pode olvidar que os efeitos e limites da coisa julgada, apesar de não estarem descritos explicitamente ou decorrer de pedidos formulados em petição inicial, por exemplo, norteiam o direito processual, e não apenas isso, são os pilares do Estado de Direito, uma vez que a observância de tais preceitos garantem a segurança jurídica necessária para o desenvolvimento de todos os atos jurídicos decorrente das relações contratuais, dentre elas, a trabalhista que, tendo em vista o trato sucessivo da relação de trabalho, há que se observar os ditames do artigo 7º, inciso XXIX e artigo 11 da CLT.  

A reflexão sobre a dinâmica das relações jurídicas trabalhistas e a utilização das ações civis coletivas como instrumento de preservação dos direitos homogêneos, deve ter por ponto de partida os efeitos da coisa julgada como garantidor da segurança jurídica. 

 Portanto, cabe aos operadores do direito e legisladores buscar soluções que equacionem esses desafios, promovendo um sistema mais justo, eficaz e seguro. 

Autor: Ulysses Soares dos Santos

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