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STJ reconhece que a verdade dos fatos não faz coisa julgada e afasta expurgos inflacionários em conta poupança com saldo zero
Em maio de 2021, o STJ reconheceu que a verdade dos fatos não faz coisa julgada e afastou a condenação de banco ao pagamento de expurgos inflacionários referentes ao Plano Collor I em conta poupança cujo saldo, em março de 1990, era zero.
Expurgos inflacionários são caracterizados pela diferença entre os valores creditados na conta poupança, pelo banco e a título de correção monetária, e aqueles que o poupador entende que seriam devidos (à época dos planos econômicos).
Coisa julgada, por sua vez, nos termos do artigo 467 do Código de Processo Civil de 1973, é a “eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário”. Sobre a preclusão, o mesmo diploma dispunha, em seu artigo 473, que “é defeso à parte discutir, no curso do processo, as questões já decididas, a cujo respeito se operou a preclusão”. Estas disposições foram, em parte, repetidas pelo Código de Processo Civil de 2015 (vigente), que, em seu artigo 502, estabelece que é “coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso”, bem como se refere à preclusão em seu artigo 507, ao dispor que “é vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão”.
Entretanto, tanto o Código de Processo Civil de 1973 como o de 2015 estabelecem que a verdade dos fatos não faz coisa julgada. O artigo 463, inciso I, do Código de Processo Civil de 1973, estabelecia que a sentença poderia ser alterada, após publicada, “para Ihe corrigir, de ofício ou a requerimento da parte, inexatidões materiais, ou Ihe retificar erros de cálculo” (artigo repetido, de forma quase idêntica, no artigo 494, inciso I do Código de Processo Civil de 2015). O artigo 469, inciso II, do mesmo Código, dispunha que “a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença” não faz coisa julgada (disposição repetida, nos mesmos termos, pelo artigo 504, inciso II do Código de Processo Civil de 2015).
Feitas estas observações, o processo em referência trata de ação de cobrança proposta por poupador contra banco, a fim de cobrar os “expurgos inflacionários” supostamente incidentes sobre sua conta poupança, referentes ao Plano Collor I. O banco foi condenado ao pagamento destes expurgos inflacionários em decisão já transitada em julgado, apenas sobre os valores mantidos à sua disposição. O poupador, a partir desse momento, iniciou o cumprimento de sentença e, após a realização de perícia (que desconsiderou a inexistência de saldo, na conta poupança, em março de 1990), entendeu-se que o banco devia valores ao poupador. Contra esta decisão, a instituição financeira interpôs agravo de instrumento, ao qual, inicialmente, foi negado provimento.
O banco, por sua vez, contra o acórdão que negou provimento ao agravo de instrumento, opôs embargos de declaração, que restaram rejeitados. Além disso, opôs
novos embargos de declaração, desta vez acolhidos, com efeito modificativo, pela 18ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Em suma, no julgamento dos segundos embargos declaratórios, os julgadores entenderam que “a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença, não faz coisa julgada, de modo que (…) a justa indenização objeto do reclamo do autor, implica e impõe a correta observância do interesse legítimo, e por decorrência permite a correção, se presente erro material nas decisões judiciais antes proferidas”.
Para afastar as alegações de preclusão e de violação à coisa julgada, além de reconhecer que não há expurgos inflacionários quando o saldo da conta poupança é igual a zero, a decisão restou fundamentada nos artigos 463, inciso I, e 469, inciso II, do Código de Processo Civil de 1973. Ademais, foi reconhecida a carência da ação, o que levou à extinção do processo sem julgamento do mérito.
O poupador, por sua vez, opôs embargos de declaração, que foram rejeitados. Contra este acórdão, interpôs recurso especial, inadmitido pela Presidência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Por consequência, o poupador interpôs agravo em recurso especial, a fim de levar sua pretensão à análise do Superior Tribunal de Justiça.
Recebido no Tribunal Superior, o recurso foi distribuído à Quarta Turma, sob relatoria do Ministro Antônio Carlos Ferreira. O Ministro, em sede de decisão monocrática, negou provimento ao recurso do poupador e, por consequência, manteve o acórdão do Tribunal de origem. Em síntese, o julgador entendeu pela inexistência de “matéria preclusa ou ofensa à coisa julgada”, visto que “o erro detectado na perícia, conducente ao saldo zero no mês em que deveria incidir a diferença de correção monetária, decorreu da transferência de valores ao Banco Central, por força da legislação vigente, e do saque, pelo poupador, da quantia remanescente”.
A decisão monocrática foi publicada em maio de 2021.