Análise da fixação dos honorários advocatícios à luz do julgamento do tema 1076 pelo Superior Tribunal de Justiça 

O Superior Tribunal de Justiça, em março de 2020, afetou, sob o regime dos recursos repetitivos, o julgamento da seguinte questão jurídica: “definição do alcance da norma inserta no §8º do art.85 do Código de Processo Civil nas causas em que o valor da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados”. 

Em acórdãos publicados em 31/05/2022, nos Recursos Especiais de nºs 1850512/SP, 1877883/SP, 1906623/SP e 1906618/SP, de Relatoria do Ministro Og Fernandes, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento, no regime de recursos repetitivos, das teses a seguir:  

  1. A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou do proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória nesses casos a observância dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do artigo 85 do CPC – a depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa. 
  1. Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo. 

O objetivo do julgamento era definir o alcance da norma inserta no §8º do art.85 do CPC, com o objetivo de compreender as suas hipóteses de incidência, bem como avaliar a pertinência da fixação dos honorários por apreciação equitativa quando os valores da condenação. 

Em seu voto, o Ministro Relator Og Fernandes apontou que o CPC/2015 pretendeu trazer mais objetividade às hipóteses de fixação dos honorários advocatícios e somente autoriza a aplicação do §8º do art.85 de acordo com a apreciação equitativa do juiz em situações excepcionais, ou seja, aquelas que, havendo ou não condenação, estejam presentes os seguintes requisitos: a) proveito econômico irrisório ou inestimável ou b) valor da causa muito baixo. 

Para o Relator, a fixação dos honorários por apreciação equitativa do magistrado apenas deve ocorrer se, no caso concreto: i) o valor da condenação for irrisório; (ii) não havendo condenação, o proveito econômico pretendido com a demanda for irrisório; (ii) não for estimável o proveito econômico, ou seja, não for possível auferir qual o montante pecuniário obtido com a vitória na demanda. Nesse caso, o Ministro pondera que se deve utilizar como parâmetro o valor da causa, que, se for considerado muito baixo, permitirá a fixação dos honorários por apreciação equitativa do juiz. 

O Ministro ressalta, ainda, que a menção prevista no referido  do CPC se refere às causas em que não é possível atribuir um valor patrimonial à lide, situações que   podem ocorrer nas demandas ambientais ou nas ações de família, não devendo se confundir “valor inestimável” com “valor elevado”, observação efetiva do Código de Processo Civil, , não cabendo do Poder Judiciário, ainda que sob o manto da proporcionalidade e razoabilidade, reduzir a aplicabilidade do dispositivo legal, decorrente de escolha legislativa explicitada com bastante clareza. 

Acompanhando o voto do Min. Relator, o Ministro Luis Felipe Salomão aponta que o caput do art.85 do CPC enuncia de forma singela que “a sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor”, sendo que a inserção dos parágrafos visa a obtenção de ordem lógica, assegurando-se ao legislador expressar os aspectos complementares à norma enunciada no caput do artigo bem como as exceções à regra por este estabelecida. 

Segundo o Ministro, o CPC/2015 restringiu a possibilidade de se adotar o critério da equidade na fixação dos honorários advocatícios, o qual passou a ser admitido somente nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, independentemente de qual seja o conteúdo da decisão, inclusive aos casos de improcedência ou de sentença sem resolução de mérito (artigo 85, §6º), afastando, assim, a regra da equidade também nessas hipóteses. 

O Ministro entende que há uma verdadeira ordem de gradação contida nos §§2º, 3º e 4º, inciso III do art.85 do CPC, que deve ser observada para a fixação da base de cálculos dos honorários, sendo que somente se avança para a base de cálculo seguinte caso a hipótese sub judice não se enquadrar na anterior. 

Na mesma linha de entendimento, o Min. Mauro Campbell também aponta que o §2º do art.85 do CPC estabelece regra geral segundo a qual “os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa”. 

O Ministro Raul Araújo, adotando o mesmo posicionamento, entende que o §8º do CPC, ao permitir a fixação de honorários sucumbenciais por equidade, veicula norma excepcional e subsidiária, somente aplicável se os honorários advocatícios não puderem ser arbitrados na forma da regra geral prevista no §2º do art.85 do CPC.  Assim, entende que o CPC/2015 introduziu ordem objetiva de vocação para a fixação da base de cálculo da verba honorária, na qual a subsunção do caso concreto a uma das hipóteses legais prévias impede o avanço para outra categoria. 

Para o Ministro, se o magistrado deixar de aplicar as regras insculpidas nos §§ 2º e 3º do art. 85 para utilizar o juízo de equidade, mesmo não estando presente nenhuma das hipóteses do § 8º do mesmo dispositivo, isso representará tornar letra morta o atual CPC  quanto aos  honorários advocatícios de sucumbência, além de ferir um dos pilares fundamentais do ordenamento jurídico, consubstanciado no princípio da segurança jurídica, que garante a previsibilidade e evita a existência de decisões divergentes para situações semelhantes. 

Corroborando o entendimento do STJ, no julgamento do Agravo Regimental nos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário com Agravo de nº 1.367.266/SP, o Supremo Tribunal Federal entendeu pelo não cabimento da fixação de honorários por apreciação equitativa nos termos do art. 85, §3º, II e §5º, do CPC, quando a lide tenha valor certo e determinado, entendendo que o CPC/2015 tornou mais objetivo o processo de determinação da verba sucumbencial, devendo, assim, ser respeitada a ordem de preferência estabelecida no art. 85 do CPC. 

Ainda neste tema, houve alteração no Estatuto da Advocacia pela Lei nº 14.365, de 02/06/2022, com impacto direto no CPC, com a inclusão dos parágrafos 6º-A e 8ºA no art.85, com previsão expressa no seguinte sentido: quando o valor atualizado da causa for líquido ou liquidável, é proibida a apreciação equitativa na fixação dos honorários advocatícios. 

Alguns meses após o julgamento do tema 1076, em 13/12/2022, a 3ª Turma do STJ, por maioria, afetou à Corte Especial o REsp nº 1743330/AM e o REsp nº 1824564/RS, ambos com discussão sobre honorários milionários e a não incidência do §8º do art. 85 do CPC, mas, não obstante essa recente afetação dos recursos, a tese fixada no julgamento do Tema 1076 é a atualmente vigente. 

Autor: Monique Soares Bizarria 

Coautor: Marcus Vinicius Silva Paulino Da Costa 

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